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"Los conductos", pérola colombiana na Berlinale

"Não haverá maneira de que a Colômbia, em lugar de matar seus filhos, os faça dignos de viver?"

28/02/2020 às 6:04


A primeira pérola que encontrei nesta Berlinale foi o filme colombiano “Los conductos”, de Camilo Restrepo, diretor de 45 anos nascido em Medellín e radicado em Paris, onde faz parte de um autodenominado laboratório cinematográfico chamado L’Abominable.

Seus filmes – todos curtas antes deste, que é seu primeiro longa-metragem – são antes de tudo experimentos artísticos e com uma assinatura pessoal muito marcada. Essa é, por sinal, a ideia por trás da seção da qual o longa participa nesta 70ª Berlinale, a recém-nascida Encontros.

Mas “Los conductos”, filmado em 16 mm, com muitos planos fechados, consegue ser também bastante narrativo: acompanha a rotina de Pinky, um homem jovem que sobrevive às margens em Bogotá com drogas, roubos e trabalho ilegal, sempre, no entanto, tratando forjar sua própria dignidade. O revólver que ele carrega consigo leva a inscrição “essa é minha vida”.

Pinky, um personagem da vida real, um amigo pessoal do diretor, funciona como uma espécie de anti-messias. Por mais marginalizado que seja é alguém eternamente à busca da luz no fim do túnel, com um desejo latente de mudar o mundo. A identificação é total com esse anti-herói. E não há nada mais colombiano, latino-americano quiçás, do que isso.

Na carona da escolha do personagem, o filme mistura ficção e realidade, numa bela coreografia visual e sonora. É político em cada grão impresso na tela, sem se preocupar em nenhum momento em ser didático. Como disse Restrepo ao diretor artístico da Berlinale na estreia do filme: “Não sou bom falando do meu país”.

Pode não ser falando, mas certamente articulando sons e imagens para abordar a violência colombiana, que é um tema que perpassa seus filmes. Os premiados curtas “Cilaos” e “Impresión de uma guerra”, por exemplo, estão aí pra não me deixar mentir.

“Los conductos” vai além das imagens e sons, citando ao final o poeta colombiano Gonzalo Arango, com um lamento escrito por ele em 1975 e feito à medida para os dias de hoje: “Não haverá maneira de que a Colômbia, em lugar de matar seus filhos, os faça dignos de viver?”.

Não haverá maneira?